domingo, 29 de abril de 2012

RESUMO DE FILOSOFIA ANTIGA

RESUMO DE FILOSOFIA ANTIGA 
Prof. Atílio Monteiro Júnior

1.    Apresentando a filosofia
“Das duas uma: deve-se filosofar  ou não se deve filosofar; mas, para negar a necessidade do filosofar é, ainda assim, preciso filosofar”. (Aristóteles, Protréptico)

Ao iniciarmos o estudo da filosofia, nos colocamos algumas perguntas básicas: que é filosofia? Que assuntos estuda? Para que serve? Qual a sua história? Qual sua relação com os demais campos do conhecimento?

O que é a filosofia?
Para entender o que é a filosofia, não basta saber sua definição, é preciso praticá-la.
Nenhuma outra forma  de conhecimento pode ser identificado com a Filosofia.

Filósofo = amante da sabedoria
A filosofia não é propriamente um saber, é sabedoria.
A filosofia não fornece respostas prontas, mas indica caminhos para a solução dos problemas.

O filósofo procura sempre a raiz última do problema. Para isso, eleva aos limites extremos os potenciais da razão humana.

A filosofia auxilia o homem a se libertar  das amarras do conhecimento imposto, dos preconceitos, das armadilhas ideológicas, da visão mesquinha do mundo.
“A filosofia é um meio de libertação do homem, enquanto possibilita o livre pensar”. (Karl Jaspers)





2.    As disciplinas filosóficas
Desde seu surgimento na Grécia Antiga, em torno do século VI a. C., a filosofia foi ampliando os temas de suas reflexões até alcançar a vastidão que tem hoje.

O surgimento de vários campos da filosofia obedeceu, e ainda obedece, às exigências do pensamento humano, suas necessidades e crises ao longo da história, pois, se a filosofia é crítica sobre a vida, ela vai repensar exatamente aquelas questões que incomodam em cada momento da história humana.

Principais disciplinas filosóficas ou campos de estudo:
a)    Metafísica (ontologia) – reflete sobre o SER. Estuda o ser em geral, quando tenta buscar o que as coisas são. O que é o ser? Quando estuda o ser em particular, dedica-se ao estudo racional da alma, do mundo (cosmologia) ou de Deus (teodicéia).
Alguns autores chegam a diferenciar metafísica de ontologia: enquanto a metafísica  estuda o ser em geral, a ontologia estuda o ser a partir da consciência do indivíduo, ou seja, busca o significado do ser a partir da experiência concreta do homem.
b)    Lógica – estuda as regras do bom raciocínio. A correspondência entre o raciocínio e a realidade. Modernamente desenvolveram-se a lógica dialética e a lógica matemática.
c)    Teoria do Conhecimento – tem por objeto o conhecimento em geral (a possibilidade de conhecer, a origem, a essência do conhecimento e a natureza da verdade).
d)    Cosmologia – reflete sobre a natureza do mundo físico (sua origem, constituição, o que é tempo e espaço, etc).
e)    Filosofia Moral – tem como objeto todos os aspectos relacionados ao agir humano. Reflete sobre o que é o bem e o mal, sobre o fim da conduta humana, sobre o modo como os homens se comportam e sobre os pressupostos necessários à ocorrência de um ato moral (liberdade, consciência e norma).
f)     Antropologia filosófica – procura responder à pergunta: quem pé o homem. Tenta responder aos diversos aspectos da natureza humana ou do comportamento humano: a racionalidade, a linguagem, a dimensão física, o espírito, a sociabilidade, a religiosidade, a dimensão econômica, a historicidade, a angústia, etc.
g)    Filosofia política  - reflete sobre a necessidade, os fundamentos e a legitimidade da constituição do poder público.
h)   Filosofia da linguagem – pensa os mais variados problemas relativos à linguagem: sua origem, as condições necessárias à linguagem humana, suas funções e suas relações com o pensamento.
i)     Filosofia da história – pensa sobre a historicidade do ser humano, o sentido e a direção da história, a natureza e o significado do tempo, enquanto pressuposto da história.
j)      Estética – reflete sobre o belo em geral, tanto o belo produzido pelo homem, quanto o belo natural.
k)    Filosofia da religião – procura caracterizar o sentimento de religiosidade do homem, a origem da religião, suas funções e suas relações com as outras dimensões das experiências individuais e culturais humanas.
l)     Filosofia da Ciência – investiga os fundamentos das ciências, a natureza e os limites do conhecimento científico, seus métodos, sua natureza e os limites do conhecimento científico.
m)   Filosofia da Educação – pensa sobre o sentido da atividade educativa, a natureza do educando e os alcances dos métodos desenvolvidos pela pedagogia.
Estas são as algumas disciplinas filosóficas. Há ainda outros campos, na medida em que a filosofia pode tomar como objeto de pesquisa qualquer parte da realidade, quer em seu aspecto concreto, quer em seu aspecto abstrato. Assim, num certo sentido, podemos dizer que “tudo passa pela filosofia”.

3.    Para que serve a filosofia?
Vivemos em uma sociedade cuja mentalidade é fortemente utilitarista. O utilitarismo, parente do pragmatismo, consiste na idéia de que algo só merece ser levado a sério caso venha a dar resultados práticos imediatos. A interioridade e a espiritualidade são menosprezadas e, com elas, tudo o que diga respeito à valorização de si mesmo, como um ser vocacionado para algo mais que um simples transitar pelo mundo, movido somente pelo objetivo de desfrutar de todos os bens materiais que este possa lhe proporcionar.
Algumas atitudes de quem se comporta levado pela mentalidade utilitarista: estuda somente para obter um diploma e ganhar dinheiro; aceita uma religião só porque esta é capaz de lhe trazer certas vantagens, como por exemplo: curas; tem amizades, na medida em que os amigos lhe possam ser úteis; aceita a pesquisa científica, enquanto esta lhe traz certos benefícios. Vê o mundo com os olhos do Tio Patinhas: dá dinheiro ou é imediatamente prático, então vale a pena, caso contrário, não.
Vista sob este ângulo, a filosofia pode ser considerada inútil, pois não descobre remédios, não planeja formas de ganhar dinheiro, não serve para fabricar máquinas ou coisas parecidas. Pelo contrário, neste sentido, a filosofia é até mesmo perigosa, já que pode despertar para uma visão das coisas em que a noção do útil vem a se alterar e os valores materiais, ao invés de valores perenes, passam a ser considerados como valores relativos e dependentes de outros como os valores intelectuais, éticos, espirituais, etc.
Quatro histórias para debate
a)   A raposa e as uvas
b)   O sábio e o rico
c)   A roupa nova do rei
d)   As botas do camponês
As histórias mostram que a filosofia é um pensar coerente, pois faz emprego de recursos do raciocínio lógico, profundo, enquanto vai até as raízes dos problemas, não permanecendo na superfície (o contrário do achismo) e abrangente, já que procura abordar as questões tendo presente o contexto em que estas se encontram e a multiplicidade de respostas possíveis. Enfim, procura não somente explicar as coisas, mas também em buscar o sentido que elas possam ter para a existência humana.

4.    O homem, um ser cultural
Cultura é o conjunto de todas as atividades humanas, inclusive daquelas condenáveis. É o conjunto de todas as coisas que os homens fazem de si mesmos e de seu mundo, e o que eles pensam e falam a esse respeito. Eles a produzem enquanto acrescentam algo à natureza, através da palavra, do trabalho, das artes, da moral, das crenças, do conhecimento, dos instrumentos, etc.
Somente o homem, enquanto dotado de inteligência abstrata e intencionalidade, é capaz de produzir cultura. Cada povo produz sua cultura. A cultura não é uma dádiva da natureza, mas conquista de um povo. Sem o meio social, onde nasce a cultura, o homem não se humaniza. Entre o indivíduo e a cultura se estabelece uma relação de troca: ele contribui para moldá-la e ela o influencia.





5.    Mito e filosofia
Mito: É uma narrativa sobre a origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas...). Para os gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido, para ouvintes que recebem a narrativa como verdadeira porque confiam naquele que narra: é uma narrativa feita em público, baseada portanto na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador.                                                      
                                                    
Diferença fundamental
                                                              
Filosofia: - Na história do pensamento ocidental, a filosofia nasce na Grécia entre os séculos VI e VII a. C. promovendo a passagem do saber mítico para o pensamento racional. Essa passagem ocorreu, no entanto, durante longo processo histórico, sem um rompimento brusco e imediato com as formas de conhecimentos utilizadas no passado.
De fato, durante muito tempo os primeiros filósofos gregos compartilharam de crenças míticas, enquanto desenvolviam o conhecimento racional que caracterizaria a filosofia. Essa transição do mito à razão “significa precisamente que já havia, de um lado, uma lógica do mito e que, de outro lado, na realidade filosófica ainda está incluído o poder do lendário”, conforme afirma Pierre Grimal.
A força da mensagem dos mitos reside, portanto, na capacidade que eles têm de sensibilizar estruturas profundas, inconscientes, do psiquismo humano.








6.    Filósofos Pré-Socráticos

Os primeiros filósofos viveram por volta dos séculos VI e V a.C e, mais tarde, foram classificados como pré-socráticos, quando a divisão da filosofia grega se concentrou na figura de Sócrates. Os primeiros pensadores centraram sua atenção na natureza e elaboram diversas concepções de cosmologia, procurando a racionalidade constitutiva do universo.

                                                                                                                                                                                                                        Cosmologia: Busca pelo principio natural, eterno, imperecível e imortal, gerador de todos os seres. Em outras palavras, a cosmologia não admite a criação do mundo a partir do nada, mas afirma a geração de todas as coisas por um principio natural de onde tudo vem e para onde tudo retorna.

Os nomes mais importantes deste período são:
Tales de Mileto (623-546 a.C): “TUDO É ÁGUA”  Considerava a água como sendo a origem de todas as coisas, e seus seguidores, embora discordassem quanto à “substância primordial” (que constituía a essência do universo), concordavam com ele no que dizia respeito à existência de um “princípio único" e primordial.

Anaxímandro de Mileto (610-547 a.C): “NEM ÁGUA NEM ALGUM DOS ELEMENTOS, MAS ALGUMA SUBSTÂNCIA DIFERENTE, ILIMITADA, E QUE DELA NASCEM OS CÉUS E OS MUNDOS NELES CONTIDOS”. Ele diz que o mundo é constituído de contrários, que se auto-excluem o tempo todo. A existência é um combate eterno entre os elementos. Acreditava ser possível eleger uma única substância  material como o princípio primordial de todos os seres, a arché. Por isso denominou-o ápeiron, termo grego que significa “indeterminado”, o “infinito”, a “massa geradora” dos seres contendo todos os elementos contrários.
Anaxímenes de Mileto (588 – 524 a.C.) – “E ASSIM COMO A NOSSA ALMA, QUE É AR, NOS MANTÉM UNIDOS, DA MESMA MANEIRA O VENTO ENVOLVE TODO O MUNDO”. Admitia que a origem de todas as coisas é indeterminada. Mas recusava-as a atribuir-lhe  o caráter oculto de elemento situado fora dos limites da observação sensível. Acreditava ser o ar o princípio de todas as coisas: a força vital, a divindade que “anima” o mundo.
Pitágoras de Samos (570-490 a. C.)“TODAS AS COISAS SÃO NÚMEROS”. Para Pitágoras, a essência de todas as coisas reside nos números, os quais representam a ordem e a harmonia. Assim, a essência dos seres, a arché, teria uma estrutura matemática da qual derivariam problemas como : finito e infinito, par e ímpar, unidade e multiplicidade, reta e curva, círculo e quadrado, etc. Pitágoras dizia que  no “fundo de todas as coisas” a diferença entre os seres consiste, essencialmente, em uma questão de números (limite e ordem das coisas). As contribuições da escola pitagórica podem se encontradas nos campos da matemática, da música e da astronomia. Junta-se a isso uma série de crenças sobre a imortalidade da alma, a reencarnação dos pecadores, e prescrições de rígidas condutas morais.
 Heráclito de Éféso (544-484 a.C): “TUDO FLUI, NADA PERSISTE, NEM PERMANECE O MESMO. O SER NÃO É MAIS QUE O VIR-A-SER”. Segundo este pensador, tudo flui, todas as coisas mudam sem cessar, e o que temos diante de nós em dado momento é diferente do que foi há pouco e do que será depois: “Nunca nos banhamos duas vezes no mesmo rio”, pois na segunda vez não somos os mesmos, e também o rio mudou.
                                                Heráclito é considerado o primeiro representante do pensamento dialético.  Concebia a realidade do mundo  como algo dinâmico, em permanente transformação. Para ele, a vida era fluxo constante, impulsionado pela luta de forças contrárias: ordem e desordem, o bem e o mal, o belo e o feio, a construção e a destruição, a justiça  alegria e a tristeza, etc. assim, afirmava que “a luta é a mãe, rainha e princípio de todas as coisas”. É pela luta das forças opostas que o mundo se modifica e evolui.
Texto: Música “Como uma onda”
Nada do que foi será
De novo do jeito que já foi um dia
Tudo passa
Tudo sempre passará
A vida vem em ondas
Como
um mar
Num indo e vindo infinito
Tudo que se vê não é
Igual ao que a gente
Viu há um segundo
Tudo muda o tempo todo
No mundo

Não adianta fugir
Nem mentir
Pra si mesmo agora
Há tanta vida lá fora
Aqui dentro sempre
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar

Nada do que foi será
De novo do jeito
Que já foi um dia
Tudo passa
Tudo sempre passará
A vida vem em ondas
Como
um mar
Num indo e vindo infinito

Tudo que se vê não é
Igual ao que a gente
Viu há um segundo
Tudo muda o tempo todo
No mundo
Não adianta fugir
Nem mentir pra si mesmo agora
Há tanta vida lá fora
Aqui dentro sempre
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar

Parmênides de Eléia (510-470 a.C.)- “O ENTE É; POIS É SER E NADA NÃO É”. Parmênides tornou-se célebre por ter feito oposição a Heráclito. Parmênides defendia a existência de dois caminhos para a compreensão da realidade. O primeiro é o da filosofia, da reflexão, da razão, da essência. O segundo é o da crendice, da opinião pessoal, da aparência enganosa. Segundo Parmênides, o caminho da essência nos leva a concluir que na realidade existe o ser, e não é concebível sua  não  existência.  O ser é; o não-ser não é. Parmênides é o primeiro filósofo a formular os princípios lógicos de identidade e de não-contradição, desenvolvidos depois por Aristóteles.

Zenão de Eléia (488-430 a.C.) – “O QUE SE MOVE SEMPRE ESTÁ NO MESMO AGORA”. Discípulo de Parmênides, Zenão elaborou argumentos  para defender a doutrina de seu mestre. Com eles pretendia demonstrar que a própria noção de movimento era inviável e ilusória.

Empédocles de Agrigento (490-430 a. C.) “POIS DESTES (OS ELEMENTOS) TODOS SE CONSTITUÍRAM HARMONIZADOS, E POR ESTES É QUE PENSAM, SENTEM PRAZER E DOR”. Aceitava de Parmênides a racionalidade que afirma a existência e permanência do ser (o ser é), mas procurava encontrar uma maneira de tornar racional os dados captados  pelos sentidos.
                                                Defendia a existência de quatro elementos primordiais que constituem  as raízes de todas as coisas percebidas: o fogo, a água, a terra e o ar. Esses elementos são movidos e misturados de diferentes maneiras em função de dois princípios universais opostos: amor, responsável pela força de atração e união, harmonizando as coisas e ódio, responsável pela força de repulsão e desagregação e pelo movimento de decadência e separação das coisas.

Demócrito de Abdera (460-370 a.C.) – “O HOMEM É UM MICROCOSMO”. Responsável pelo desenvolvimento do atomismo, Demócrito afirmava que todas as coisas que formam a realidade são constituídas por partículas invisíveis e indivisíveis. Essas partículas foram chamadas átomos, termo grego que significa “não-divisível”. Para Demócrito, é o acaso ou a necessidade que promove a aglomeração de certos átomos e a repulsão de outros. O acaso é o encadeamento imprevisível das coisas. A necessidade é o encadeamento previsível e determinado entre as causas.
                                                A principal contribuição trazida pelo atomismo de Demócrito à história do pensamento é a concepção mecanicista, segundo a qual, tudo o que existe no universo nasce do acaso ou da necessidade. Isto é, nada nasce do nada, nada retorna ao nada. Tudo tem uma causa. E os átomos são a causa última do mundo.

Texto para debate
A ciência se inicia com problemas
“Um problema significa que há algo errado ou não resolvido com os
fatos. O seu objetivo é descobrir uma ordem invisível que
transforme os fatos de enigma em conhecimento.
Aqui somos forçados a viajar séculos para trás, para os tempos em
que nossos pais, os gregos, começaram a pensar sobre o mundo
fazendo-se as perguntas com que os cientistas lutam  até hoje.
Porque as perguntas que eles fizeram não admitiam uma resposta
única e final. Eram como portas que, uma vez abertas, vão dar
numa outra porta, muito maior, é verdade, que por sua vez dá em
outra, indefinidamente. E aqui estamos nós abrindo portas com as
perguntas que geraram as nossas chaves. Vamos seguir o seu
pensamento.
Você já notou que a nossa experiência cotidiana, o que vemos,
Ouvimos, sentimos, é um fluxo permanente de impressões que não
se repete nunca? “Tudo flui, nada permanece. Não se pode entrar
duas vezes num mesmo rio”, dizia Heráclito de Éfeso.
A despeito disso – e aqui está algo que é muito curioso – nós somos
capazes de falar sobre as coisas, de ser entendidos, de ter
conhecimento.
Nunca mais haverá nuvens idênticas àquelas que produziram o
temporal de ontem. A despeito disso, serei capaz de identificar
nuvens como nunca existiram antes e dizer que delas a chuva virá.
Também nunca mais terei uma laranjeira como aquela que morreu
de velhice. Mas serei  capaz de identificar uma outra da mesma
qualidade e de prever quanto tempo levará para começar a dar os
seus frutos.
Como explicar que o meu discurso sobre as coisas não fique colado
às suas aparências? Parece que, ao falar, eu sou capaz de enunciar
verdades escondidas, ausentes do visível, expressivas de uma
natureza profunda das coisas. Tanto assim que, quando falo,
pretendo que estou dizendo a verdade não apenas sobre aquele
momento transitório, mas também sobre o passado e o futuro.
Laranjas são doces, a água mata a sede, as estrelas giram em torno
da Terra, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados
dos catetos: estas não são afirmações sobre o sensório e o
imediato. Elas têm pretensões universais.
Esta foi a grande obsessão da filosofia grega: estabelecer um
discurso que falasse sobre a natureza íntima das coisas, que
permanece a mesma em meio à multiplicidade de suas
manifestações.
A leitura da filosofia grega nos introduz, passo a passo, às
Diferentes fases dessa busca, a partir dos filósofos milesianos que
achavam que as coisas mantinham sua unidade em meio à
multiplicidade porque, lá no fundo, todas se reduziam a um mesmo
suco, uma mesma essência. Progressivamente houve uma
passagem desta posição, que explica a unidade em termos de
substância, para uma outra que considera que a questão
fundamental são as relações e funções.
                                                RUBEM ALVES. Filosofia da ciência, p. 40-41.

Questões para debate:
Rubem Alves estabelece uma relação entre o início da filosofia e o início da ciência. Que relação é essa?
Como o autor sintetiza a evolução da filosofia grega em seus primórdios?



  1. SOFISTAS: MESTRES DA ARTE DE ARGUMENTAR
Os assim chamados sofistas, sucederam aos pensadores preocupados com a questão de buscar um princípio primordial (arché) de tudo o que existe. A reflexão agora, caracteriza-se pelo  interesse pelo próprio homem e suas relações políticas e sociais.
Além da política, os sofistas provocaram uma indagação sobre a teoria do conhecimento. Talvez em razão do nomadismo, afirmavam que a verdade não existe; segundo eles, existem tantas verdades quantas foram as mentes humanas. A verdade é relativa a quem a defende. Fundamentavam tal tese no fato de cada povo ter crenças e costumes próprios. Como conseqüência deste relativismo do conhecimento, não reconheciam o valor da lei escrita como garantia de justiça. Esta posição, aliada ao fato de o homem não estar preparado para assumira  vida política, propiciou aos sofistas intitularem-se “mestres da arte de fazer política”,  com o objetivo de ensinar aos jovens gregos a “arte política”. Eram professores, portanto, e cobravam pelo ensino que davam. Foram os precursores da pedagogia.
Protágoras de Abdera ( 480-410) – “O HOMEM É A MEDIDA DE TODAS AS COISAS”. Ensinava em Atenas que  tudo é relativo ao que o homem pensa, ou seja, o mundo é o que o homem constrói e destrói. Não existem para Protágoras, verdades imutáveis. A conseqüência disto é tornar a filosofia algo de grande subjetividade, pois qualquer coisa pode ser tanto falsa ou verdadeira dependendo do ponto de vista de cada um.

Texto para debate
O relativismo de Protágoras  leva ao subjetivismo,  como se lê em Platão, no texto da obra Teeteto, que segue: “e não  quer dizer com isso que,  tal como as coisas individuais me aparecem, tais são para mim, e tais a ti; tais para ti,  porque és homem como eu sou homem? Mas não acontece  às vezes que,  soprando o mesmo vento,  um de nós sente frio e outro não? E um sente pouquíssimo e outro muito? E então, como chamaremos este vento: frio ou não-frio? Ou deveremos acreditar em Protágoras, que para quem sente frio é frio, para quem não sente, não é?


Górgias de Leontini (487-380) – “O BOM ORADOR É CAPAZ DE CONVENCER QUALQUER PESSOA  SOBRE QUALQUER COISA”.  Este pensador  ensinava  o ceticismo absoluto,  através do qual afirmava que nada existe e se existisse não poderia ser conhecido. E se algo fosse conhecido, não poderia ser comunicado a ninguém.
Nas duas primeiras teses , está contida  a idéia de que  nada se pode afirmar com certeza sobre a realidade  das coisas. Como argumento principal. Górgias apontou  as colocações dos filósofos anteriores,  que discutiam sobre o primeiro princípio de tudo,  sobre o movimento, as relações entre o ser e o não-ser, etc.
A terceira tese tem sua base no conceito  da origem e da extensão da linguagem.  Esta tem sua  origem em mera convenção e não é capaz de expressar  o que as coisas realmente são, ou seja, a verdade. Para ele, entre as palavras e as coisas existem grandes diferenças. Uma coisa é a palavra, outra é a idéia à qual se refere. Assim, nunca seria possível a comunicação. 
Apesar disso,  sabia que as palavras tem o poder de enfeitiçar.  Não porque sejam verdadeiras ou levem à verdade, mas porque há pessoas que se deixam enganar.  Consciente do poder das palavras, Górgias dizia que seria capaz de convencer qualquer um sobre o que quer que fosse.






  1. SÓCRATES (469 – 399 a. C. ) – “ELE SUPÕE SABER ALGUMA COISA E NÃO SABE, ENQUANTO EU, SE NÃO SEI, TAMPOUCO SUPONHO SABER. PARECE QUE SOU UM POUCO MAIS SÁBIO QUE ELE EXATAMENTE POR NÃO SUPOR QUE SAIBA O QUE NÃO SEI”.  Sócrates também abandonou as preocupações que dominavam os filósofos pré-socráticos em buscar o princípio primeiro de tudo que existe e voltou sua preocupação filosófica para a questão do homem. A filosofia socrática foi determinada pela convicção de que o homem traz em si a capacidade de conseguir a verdade. Deste modo, as verdades que o homem poderia conhecer não seriam aquelas que dizem respeito à natureza física do mundo, mas as de ordem metafísica, ou seja, aqueles conhecimentos que estão além da realidade sensível (o bem, as virtudes, os valores, etc).
Nesse sentido, Sócrates preconizava a existência de verdades universais que são possíveis de serem descobertas e conhecidas se o ser humano se dispuser a fazê-lo sem arrogância.
A humildade é o pressuposto fundamental de acesso à verdade, utilizando-se o método do diálogo. Sócrates preferia a palavra oral á escrita. Não escreveu nada que tenha chegado até nós. Filosofava nos ambientes das ruas e praças atenienses.
Defendia que existem verdades absolutas e que havia um mundo puramente espiritual onde vivem tanto as almas dos humanos quanto as verdades absolutas.
A questão fundamental do pensamento socrático é: o que é o homem? A isso ele respondia que “o homem é a sua alma”. A alma para ele, seria a sede da atividade racional, ética e do conhecer.
O método socrático de ensino, segundo ele mesmo, seria semelhante ao processo de um parto. Sócrates via a sua missão como a de uma parteira que, ao invés de fazer nascer um bebê, parteja idéias que já estão em gestação na consciência do ser humano.
O método socrático, então, divide-se em dois grandes momentos:
1.    IRONIA (interrogação) – diferentemente do sentido que essa palavra tem hoje, a ironia socrática consistia numa forma de dialogar onde a arrogância inicial do interlocutor que julgava já conhecer certo assunto suficientemente,  era demolida. Através de perguntas sutis e logicamente encadeadas, ele levava o interlocutor à contradição. Assim, destruía a arrogância dos preconceitos e da falsa ciência. Para começar a caminhar rumo à verdade, era necessário antes que o discípulo assumisse uma postura de humildade reconhecendo a própria ignorância, até chegar a perceber com o próprio Sócrates que “só sei que nada sei”.
2.    MAIÊUTICA (partejar) – tendo removido as resistências do discípulo pela ironia, este poderia a seguir, iniciar o caminho para descobrir o conhecimento das verdades que já possui dentro de si mesmo. Sócrates não ensinava verdades acabadas, mas através do diálogo, e utilizando uma série de perguntas, levava o seu interlocutor a trazer à luz (parto) as idéias já existentes em seu espírito.
Para Sócrates, algumas concepções são inatas a todos os homens. Por isso, acreditava na universalidade de certas idéias. A maiêutica constitui, assim, na arte de partejar, ou “dar à luz” idéias já existentes na alma, através do diálogo induzido pelo mestre ao discípulo.
Como fim desse processo, ocorre o conceito, quando o discípulo consegue aflorar na consciência as verdades antes observadas apenas no mundo inteligível das idéias. O discípulo, por assim dizer, recorda o que já viveu no mundo das idéias, adquirindo o conhecimento verdadeiro. Por isso, para Sócrates, conhecer é recordar.


  1. PLATÃO (427-347 a. C.) – Das aparências ao mundo das idéias.


“OS MALES NÃO CESSARÃO PARA OS HOMENS  ANTES QUE A RAÇA DOS PUROS E AUTÊNTICOS FILÓSOFOS CHEGUE AO PODER”.
Foi Platão quem desenvolveu o primeiro grande sistema filosófico do ocidente, partindo das idéias de seu mestre, Sócrates. O conceito mais importante de seu pensamento consiste na Teoria das Idéias. Por meio dela ensinava que o mundo visível, sensível, terreno, com tudo o que existe, são cópias imperfeitas de um mundo eterno e perfeito, denominado Mundo das Idéias ou Hiperurânio.  Esse mundo celeste, eterno e perfeito, Nesse mundo ideal habitam eternamente as idéias reais e perfeitas de tudo o que existe. Nesse mundo também habita a idéia suprema do Bem.
Para Platão, o mundo físico surgiu da atividade criadora do Demiurgo,  um ser superior que contemplando o mundo das idéias,  moldou tudo o que existe de acordo com as formas eternas. Assim, este mundo seria uma simples cópia da realidade celeste. Por isso, o mundo sensível é aparente, imperfeito,  mera sombra da realidade do mundo superior.
Desse modo, o conhecimento, para Platão,  acontece por meio do processo de passagem  do mundo das sombras,  enganoso, para o mundo das idéias, o mundo real das essências.

O primeiro momento desse processo é  permeado pelas impressões e sensações que nos trazem os sentidos.  A vivência dessas sensações ou impressões da experiência levam o homem à opinião que temos da realidade. A opinião significa, assim, o conhecimento que temos sem um método.
O verdadeiro conhecimento, para Platão, deve ir além do plano das impressões e dos sentidos, ou seja, da opinião. Para ele, para se ter o conhecimento verdadeiro é necessário passar para a dimensão racional da sabedoria, o mundo das idéias.  Para alcançar este nível, o ser humano não pode ter apenas opiniões (doxa), precisa possuir o verdadeiro amora ao saber (filosofia).
Assim temos:
- Opinião = doxa. Percepção da aparência e diversidade das coisas.
- Conhecimento = Sofia. É elaborado quando se alcança a ideia, deixando as aparências e ilusões.
Esse conhecimento que o homem adquire na vida terrena ocorre em dois níveis: a doxa (opinião) e a epistéme (ciência).
A doxa, pode dar-se em dois níveis: imaginação (eikasía) ou crença (pístis)
A epistéme ocorre também em dois níveis: como ciência (diánoia), que seriam as ciências geométirco-matemáticas ou como intelecção pura (noésis), que seria a captação pura das idéias, a visão intelectual do mundo das idéias, governada pela idéia do Bem.
Para Platão, a maioria dos homens permanecem no plano da doxa. Alguns, os matemáticos, alcançam a diánoia, e apenas os filósofos têm acesso à noésis, alcançada pela dialética.
O método, o caminho proposto por Platão para se alcançar este conhecimento (epistéme) é a dialética.
A dialética será o processo de submeter uma opinião à crítica que dela podemos fazer. Desse modo, a afirmação de uma tese qualquer pode ser provada por meio de discussão que negue a validade da tese, livrando-a assim, de erros e enganos.
A dialética seria, pois, um lento processo de superação da alma que, pouco a pouco, vai se libertando das influências das imagens do mundo terreno fornecidas pelos sentidos, até o ponto de atingir o mundo das idéias.
O acesso ao mundo das idéias somente será possível quando sairmos do plano do sensível, do enganoso, das aparências. No mundo racional das idéias alcançamos a contemplação do ser absoluto, eterno e imutável. O acesso a esse mundo das idéias se dá a partir do conhecimento racional, ou filosófico.
Para Platão, a alma humana é imortal, mas está unida ao corpo como que para cumprir uma pena por alguma culpa. Assim, o corpo seria a fonte de todos os males do ser humano, tais como: doenças, angústias, tristeza, limitações de todo tipo, frustrações, influxo das paixões, etc.  Esse aprisionamento da alma no corpo impede que ela possa ter acesso ao mundo das idéias, onde estão as realidades eternas.
Os sentidos humanos seriam imperfeitos porque dão imagens diferenciadas, e a sensibilidade não é igual em todas as pessoas;  aquilo que é verdade para um, não é verdade para outro. A grande maioria dos homens acreditam nessas noções superficiais como se fossem verdadeiras. Outros, percebem os limites dos sentidos e procuram a verdade que seja superior a todas as opiniões particulares. São os cientistas, especialmente os matemáticos, que procuram a verdade universal.  No entanto, o que Platão chamou de conhecimento científico, somente pode ser superado por aquele que, num esforço intelectual, (theoría) chegou à ideia suprema do Bem. Este é o filósofo.

TEXTO PARA DEBATE: O MITO DA CAVERNA.





Arte e Retórica
Na filosofia platônica, a arte foi muito desprezada. Platão dizia que a arte é mímesis, ou seja, imitação. Se as coisas presentes no mundo sensível são cópias das realidades do mundo das idéias, então a arte é cópia da cópia. E de todas as artes a poesia é a pior, pois o poeta fala sem saber o que diz, como que irracionalmente.
Para Platão, a distância entre o artista e o matemático e o filósofo é muito grande, pois o filósofo e o matemático lidam com conceitos universais e o artista com imagens imperfeitas de coisas imperfeitas.
Outra arte muito combatida por Platão foi a arte da retórica. Na época de Platão era uma atividade muito importante, tendo em vista a importância da política em Atenas. Quem usava a retórica estava mais interessado em convencer os demais, mesmo que não fosse pela verdade. Para Platão, a retórica atinge a pior parte da alma, crédula e instável. O retórico é um demagogo, hábil na arte de convencer enganando.

Política em Platão
“Deixei-me levar por ilusões que nada tinham de espantosas por causa de minha juventude. Imaginava que, de fato, governariam a cidade reconduzindo-a dos caminhos da injustiça para os da justiça. Fui então, irresistivelmente levado a louvar a verdadeira  filosofia e proclamar que somente à sua luz se pode reconhecer onde está a justiça na vida pública e na vida privada”. (Platão).
Para Platão, apenas filósofos teriam  capacidade de governar uma sociedade ideal, uma vez que eles seriam libertos das ilusões das aparências das coisas.  Em sua obra A República, imaginou uma sociedade onde o governo é exercido pelos reis-filósofos, capazes de, através da contemplação,  agir de acordo com a idéia do Bem
Deste modo,  Platão preconiza seu ideal de organização social e política, dividindo o Estado em três classes: o povo, o exército e os governantes.
A classe do povo, formada por agricultores, comerciantes, artesãos, profissionais liberais e escravos,  está na base da pirâmide social e é a mais desprezada.  Devem aceitar tudo o que lhes impõem as leis. Cabe ao povo somente suprir as necessidades do Estado com o seu trabalho e sua produção.
Os integrantes do exército, não têm nenhum direito privado. Vivem totalmente à disposição do Estado, sem poder constituir família, ter bens, nem lazer.  Tudo para eles é regulado pelo Estado, que determina a união sexual unicamente com finalidade de procriação e de acordo com os critérios do Estado. O exército não participa do governo, tendo como função básica zelar pela segurança e pela ordem interna e externa da polis.
Já a classe dos governantes, é aquela ocupada pelos reis-filósofos, por homens com mais de cinqüenta anos. Governam com total autoridade e com poder inquestionável.  No entanto, o governante que Platão idealizou, não corresponde àquela postura socrática tão celebrada nos diálogos.  Parecem-se antes a ditadores instruídos por dogmas.

Exercícios/Discussão
1.    Explique o que você entendeu do Mito da Caverna. Na sua opinião, seria possível ao homem libertado convencer seus companheiros sobre a realidade vivenciada do lado de fora da caverna?
2.    Quais as semelhanças e diferenças entre a sociedade idealizada por Platão e a sociedade em que vivemos?

  1.  ARISTÓTELES (384-322 a. C.) – “TODA ARTE E TODA A INDAGAÇÃO, ASSIM COMO TODA AÇÃO E TODO PROPÓSITO, VISAM A ALGUM BEM”. 



O pensamento de Aristóteles é um dos mais extensos e completos sistemas filosóficos. Foi, e ainda é referência para muitas questões ainda hoje debatidas em filosofia.
Diferentemente de Platão, Aristóteles afirmava que todo conhecimento começa pelos sentidos. Para ele, os dados fornecidos pelos sentidos são trabalhados pela razão e brota daí, o conhecimento verdadeiro. Dizia ele; “Nada há no intelecto que não tenha passado primeiro pelos sentidos”.  Aristóteles discordou radicalmente de seu mestre Platão. Para ele, não era necessário que a alma exista antes no mundo das ideias e se recorde do que viu nessa dimensão. Não precisa nem mesmo do processo dialético para ter conhecimento. Para Aristóteles, é necessário determinar a essência das coisas.
Aristóteles entendia que este mundo é plenamente real, ensinando que o intelecto humano é capaz de formular conceitos seguros e verdadeiros a partir das informações dos sentidos.

METAFÍSICA
As ideias acima levam ao centro da filosofia aristotélica, que ele chamou de filosofia primeira, a sua metafísica. Assim, ele colocou algumas questões fundamentais sobre o ser: Por que existe o ser? O que é o ser?  O que é a substância?
À pergunta por que existe o ser? Aristóteles respondeu elaborando a teoria das quatro causas. Cada uma delas é causadora do que é possível saber do ser como ele se nos apresenta. As causas são as seguintes:
- Causa formal – é a forma ou a ideia das coisas, determinadas estruturas para diferentes coisas. Refere-se à forma ou configuração de uma coisa. Ex: uma estátua em forma de homem ou mulher, ou cavalo.
- Causa material – é aquilo de que é feita alguma coisa. Refere-se, pois, à matéria de que é feita uma coisa. Ex: o mármore que um escultor utiliza para esculpir uma estátua.
- Causa eficiente – é aquilo que causa o movimento  e a mudança das coisas. Ex: os pais em relação aos filhos ou o trabalho do escultor que, com seus instrumentos, talha o mármore. É o agente que produziu a coisa.
- Causa final – é o fim das coisas e das ações; é aquilo para que uma coisa é produzida ou existe: é o bem de cada coisa. Ex: a manutenção da espécie ou, no caso da estátua, a intenção do escultor, exaltar a figura de alguém, etc.

Os significados do ser
Aristóteles vai propor a pergunta: o que é o ser? Buscou a resposta das mais diversas maneiras, desde as respostas dadas pelos filósofos anteriores, até a relação do ser com a substância, sua estrutura e seus significados.
O que Aristóteles quis foi afirmar que somos capazes de dizer o ser das coisas, não de uma única forma, apenas, mas de vários modos. Assim, para ele, o ser pode ser dito de vários modos, dependendo da perspectiva a partir da qual seja considerado. Assim, temos:
a)    O ser se diz no sentido acidental. Ex. Quando dizemos que “o rio é limpo”.
b)    O ser se diz no sentido essencial. Indica o que o ser é em si. É a ideia substancial que fazemos de algo. Considera-se aquilo que o ser necessariamente deve ser.
c)    O ser se diz como verdadeiro, ao contrário do não-ser, falso. É o ser “lógico”. Ex: se digo que uma casa branca é preta, a “casa preta” é um não-ser, é falso.
d)    O ser se diz como potência e como ato. Ex: dizemos que vê, seja quem pode ver (potência) como quem vê de fato (ato).

Substância e acidente
Para Aristóteles, substância  é o elemento que constitui a realidade íntima do ser. É o ser em si mesmo considerado. A substância é aquilo que faz com que uma coisa seja aquilo que é e não outra.
Na filosofia anterior a Aristóteles, alguns diziam que substância é a matéria; outros, os platônicos, diziam que é a forma e o senso comum dirá que é o indivíduo ou a coisa concreta.  Aristóteles diz que cada um tem uma parte de razão, apenas. Segundo ele, o erro de todos consistiu na unilateralidade. Portanto, ele explica os três significados de substância do seguinte modo:
a)    Num certo sentido, substância é forma. Não a forma extrínseca ou exterior das coisas, mas a forma interior, sua essência ou natureza íntima. A forma exterior é subordinada à forma interior. Assim, a forma do homem é a sua alma racional, a do cão, a sua alma sensitiva, e a do círculo, a estrutura que torna a figura um círculo.
b)    No entanto, se a alma racional não informasse um corpo, não haveria um homem. Assim, também a matéria é fundamental para a existência das coisas e também poderá ser dita, num certo limite,  como a substância das coisas. O limite seria que, se não houvesse forma, a matéria seria indeterminada e não existiriam as coisas.
c)    A síntese dos dois sentidos de substância acima resulta num terceiro, em que ela é entendida como sínolo (composto), isto é, todas as coisas resultam do composto de matéria e forma (hilemorfismo).

Acidente é aquilo que é atributo circunstancial e não essencial ao ser. Pertencem ao ser, mas não são necessários para definir a natureza própria de cada ser.

O ser segundo as categorias
Os significados, transmitidos segundo cada uma das categorias, não são idênticos mas análogos.  Enquanto dizem respeito à mesma substância. O ser pertence às diversas categorias, não do mesmo modo, nem no mesmo grau.
Se consideramos que Sócrates, após ter crescido por um certo período de tempo, para de crescer e começa a encolher (na velhice), tornando-se então, mais baixo, temos que Sócrates deixou de ser o que era (alto); por outro lado, Sócrates nunca deixou de ser um homem.
Como pode Sócrates deixar de ser alto e continuar a ser homem?
As categorias (do ser) são os diversos modos de atribuição, os
diversos tipos de predicação, os diversos significados do verbo ser — as
diversas possibilidades de predicar ou dizer alguma coisa de outra.

Aristóteles presumia que nossos modos últimos de apreensão da
realidade correspondiam a modos últimos de ser. Nunca considerou
seriamente a possibilidade de que a realidade pudesse não ser em si mesma aquilo que percebemos ou concebemos que seja. O estagirita fixou em dez o número dessas categorias últimas de ser (ou de apreender a realidade). Aqui damos a lista das dez, com seus correspondentes em latim e português:
ousía                                substantia                                substância
posón                               quantitas                                  quantidade
poidn                                qualitas                                    qualidade
prós ti                               relatio                                       relação
pou                                   ubi                                            onde (lugar)
poté                                  quando                                      quando (tempo)
keis thai                            situs                                          posição (situação)
         échein                            habitus                                   estado
          poiein                               actio                                           atividade
         paschein                        passio                                    passividade

Ser uma coisa é somente um único modo de ser — ou seja, o de
substância. A mesma realidade concreta pode incorporar muitos ou todos os modos de ser. Assim, por exemplo, de seu companheiro de Academia, Koriskos, Aristóteles podia predicar vários tipos de coisas:

Koriskos é um homem (substância ou entidade).
Koriskos é (alto de) cinco côvados (ou tem cinco côvados de altura)
(quanto).
Koriskos é sábio (qual).
Koriskos é mais alto que Kléon (relação).
Koriskos está na ágora (onde).
Koriskos esteve aqui ontem (quando).
Koriskos está sentado (postura).
Koriskos está calçado (estado ou condição).
Koriskos está empurrando (algo) (atividade).
Koriskos está sendo empurrado (passividade).

Do próprio Aristóteles podemos dizer que foi um homem (substância
ou entidade) que viveu em Atenas (lugar) no 4º século antes de
Cristo (tempo), que ensinava filosofia (atividade); acusado de ateísmo
(passividade), ficou deprimido (estado) e fugiu para a casa de amigos
(relação), etc.
Nos Tópicos, Aristóteles listou essas mesmas dez categorias, mas
chamou a primeira o que é (to esti), em vez de ousía(I, 103 b 21). Em
outras obras suas reaparece a lista, apesar de faltarem algumas das categorias
finais. Na Física, por exemplo, faltam as categorias posição e
estado (V, 225 b 5).
Aristóteles só analisou com algum detalhe as quatro primeiras categorias
— substância, quanto, qual e relação (e só essas quatro foram
posteriormente empregadas pelos Estóicos). De cada categoria perguntava: os predicados que nela se situam têm contrários ou não?; admitem graus — admitem um mais ou menos? Assim, a substância não tem contrários (nada é contrário a um cavalo), nem admite um mais ou menos (uma coisa não pode ser mais ou menos cavalo que uma outra).

Ética e virtude em Aristóteles.

Aristóteles dividiu a filosofia em duas grandes áreas: ciências teoréticas e ciências práticas.
Ciências teoréticas = estudo de formas de conhecimento puramente contemplativo, indispensáveis ao conhecimento seguro de todas as coisas. Ex: metafísica, a física, a matemática, a lógica. Estudam o necessário, não o contingente.
Ciências práticas = dedicam-se aos aspectos do agir concreto do homem. Têm por objeto o contingente, não o necessário. É o conhecimento que decorre de uma ação útil.

Em sentido amplo, Aristóteles entendeu por virtude a capacidade de um ser colocar em ato a própria natureza. Ex: a virtude de uma faca consiste em cortar bem; de uma vestimenta, em vestir bem; de um trabalhador, em trabalhar bem.
No homem, cuja natureza é a de um ser racional, a virtude consiste em realizar plenamente a sua racionalidade. A racionalidade humana, por sua vez, divide-se em dois campos: por um lado, ela se volta para a realização de fins que tocam o âmbito próprio do mundo dos homens, constituindo o costume (éthos); por outro lado, enquanto produtora de conhecimento, ela visa à realização de bens ligados ao intelecto (nous). Assim, par que o homem realize plenamente a sua natureza, é preciso que desenvolva as virtudes éticas (que envolvem a vida social, constituindo o complexo sistema de condutas e costumes) e as virtudes dianoéticas (representam a realização das indicações do intelecto). Por meio delas, a natureza humana atinge a sua plenitude.
Dentre as ciências práticas, destacam-se a ética e a política. A elas cabe a tarefa de indicar ao homem o caminho da vida virtuosa. A ética deve ser capaz de indicar quais são os fins por meio dos quais o homem realiza a sua própria natureza. Também deve indicar quais são os meios adequados para realizar tais fins.
Sendo que os fins de cada ação humana sempre se submetem a fins mais elevados, a ética deve coordenar a relação entre estes fins. Com isto, se evita a desintegração e a desarmonia do agir humano. Por isso, Aristóteles chama a ética de ciência arquitetônica. Assim como a arquitetura, a ética permite estabelecer a harmonia de uma construção, pois harmoniza o agir humano, determinando o que é o bem e quais são os meios para obtê-lo. Desse modo, ela não está em algo já dado, mas é constante realização.
O homem ético é aquele que consegue ou que possui a justa medida daquilo que deve realizar. Portanto, não errará nem por excesso, nem por falta.
No seu pensamento, Aristóteles se esforça em determinar quais seriam os fins últimos da ação humana. Aponta como justa a vida que, voltada para a ação, realiza as condições necessárias á convivência humana, cujo fim último é a própria vida social.

FILOSOFIAS HELENISTAS
A partir da conquista da Grécia pelos macedônios, (séc. IV a. C.) inicia-se o período chamado helenístico. Esse período caracterizou-se por um processo de interação e integração entre a cultura grega clássica e a cultura dos povos orientais.
Na filosofia, a produção filosófica dá continuidade às escolas platônica e aristotélica, dirigidas  pelos discípulos desses mestres. No entanto, em conseqüência da influência das culturas orientais com os valores gregos, o pensamento filosófico passou a ter características determinadas:
- declínio da participação do cidadão nos destinos da cidade, com enfraquecimento da reflexão política.
- substituição da vida pública pela vida privada.
- preocupações coletivas cedem lugar às preocupações individuais.
- as principais correntes filosóficas vão tratar mais da intimidade, da vida interior do homem.

Epicurismo
Fundado por Epicuro, propunha que o ser humano deve buscar o prazer pois, segundo ele, o prazer é o princípio de uma vida feliz. Distinguia dois tipos de prazeres. No primeiro grupo estariam os prazeres mais duradouros, que alimentam o espírito, como a boa conversação, a contemplação das artes, da música, etc. No segundo grupo estariam os prazeres mais imediatos, movidos pelas paixões que podem levar à dor e ao sofrimento. Mas para poder atingir os prazeres do intelecto, o ser humano deve aprender a dominar os prazeres exagerados das paixões. Os epicuristas buscavam a ataraxia, termo grego usado para designar o estado de ausência de dor, quietude, serenidade e imperturbabilidade da alma.
“Acostuma-te à idéia de que a morte para nós não é nada, visto que todo mal e todo bem residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência clara de que a morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida  efêmera, sem querer acrescenta-lhe tempo infinito e eliminando o desejo de imortalidade. Não existe nada de terrível na vida para quem está perfeitamente convencido de que não nada de terrível  em deixar de viver.” (Epicuro, Carta sobre a felicidade)
Estoicismo
Em seu conjunto, o estoicismo pode-se dividir em três períodos: um período antigo ou ético, um período médio ou eclético, um período recente ou religioso. Os dois últimos, bastante divergentes do estoicismo clássico.
O fundador da antiga escola estóica é Zenão de Citium (334-262 a.C., mais ou menos). Seu pai, mercador, leva para ele, de Atenas, uns tratados socráticos, que lhe despertam o entusiasmo para com os estudos filosóficos. Aos vinte e dois anos vai para Atenas; aí - perdidos seus bens - dedica-se à filosofia, freqüentando por algum tempo várias escolas e mestres, entre os quais o cínico Crates. Finalmente, pelo ano 300, funda a sua escola, que se chamou estóica, do lugar onde ele costumava ensinar: pórtico em grego, stoá. Iniciou, juntamente com a atividade didática, a de escritor. Em seus escritos já se encontram a clássica divisão estóica da filosofia em lógica, física e ética, a primazia da ética e a união de filosofia e vida.
A escola estóica média ou eclética, surge pela influência de outras escolas e para responder às objeções dessas escolas. Podem-se, pois, agrupar na escola estóica nova ou religiosa os que entendiam absolutamente a filosofia, o estoicismo, não como ciência, metafísica, mas como uma missão e uma prática religiosa, sacerdotal.

No pensamento dos estóicos, o fim supremo, o único bem do homem, não é o prazer, a felicidade, mas a virtude; não é concebida como necessária condição para alcançar a felicidade, e sim como sendo ela própria um bem imediato. Com o desenvolvimento do estoicismo, todavia, a virtude acaba por se tornar meio para a felicidade da tranqüilidade, da serenidade, que nasce da virtude negativa da apatia, da indiferença universal. A felicidade do homem virtuoso é a libertação de toda perturbação, a tranqüilidade da alma, a independência interior, a autarquia.
Como o bem absoluto e único é a virtude, assim o mal único e absoluto é o vício. E não tanto pelo dano que pode acarretar ao vicioso, quanto pela sua irracionalidade e desordem intrínseca, ainda que se acabe por repudiá-lo como perturbador da indiferença, da serenidade, da autarquia do sábio. Tudo aquilo que não é virtude nem vício, não é nem bem nem mal, mas apenas indiferença; pode tornar-se bem se for unido com a virtude, mal se for ligado ao vício; há o vício quando à indiferença se ajunta a paixão, isto é, uma emoção, uma tendência irracional, como geralmente acontece.
A paixão, na filosofia estóica, é sempre e substancialmente má; pois é movimento irracional, morbo e vício da alma - quer se trate de ódio, quer se trate de piedade. De tal forma, a única atitude do sábio estóico deve ser o aniquilamento da paixão, até a apatia. O ideal ético estóico não é o domínio racional da paixão, mas a sua destruição total, para dar lugar unicamente à razão: maravilhoso ideal de homem sem paixão, que anda como um deus entre os homens. Daí a guerra justificada do estoicismo contra o sentimento, a emoção, a paixão, donde derivam o desejo, o vício, a dor, que devem ser aniquilados.
A virtude estóica é, no fundo, a indiferença e a renúncia a todos os bens do mundo que não dependem de nós, e cujo curso é fatalmente determinado. Por conseguinte, indiferença e renúncia a tudo, salvo e pensamento, a sabedoria, a virtude, que constituem os únicos bens verdadeiros: indiferença e renúncia à vida e à morte, à saúde e à doença, ao repouso e à fadiga, à riqueza e à pobreza, às honras e à obscuridade, numa palavra, ao prazer e ao sofrimento - pois o prazer é julgado insana vaidade da alma. Dada a indiferença estóica do suicídio como voluntário e moral afastamento do mundo; isto não se concilia, porém, com a virtude da fortaleza que o estoicismo reconhece e louva, e nem se pode explicar racionalmente o suicídio, se a ordem do universo é racional, como precisamente afirmam os estóicos.

Cinismo
Do grego Kynos, que significa “cão”, designa a corrente dos filósofos que se propuseram a viver como os cães da cidade, sem qualquer propriedade oou  conforto. Levavam ao extremo a filosofia de Sócrates, segundo a qual o homem deve procurar conhecer a si mesmo e desprezar todos os bens materiais. Por esta razão, Diógenes, o pensador mais destacado desta escola, é conhecido como o “Sócrates demente”, pois questionava os valores e convenções sociais e procurava viver estritamente conforme princípios que considerava corretos.





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